Professor efetivo pode pegar cargo como professor de apoio?
Uma avaliação sobre a Nota Técnica nº4/SEE/DMTE-CEEI/2019 da SEE/MG
Jakes Paulo Félix dos Santos
Professor de Geografia
Especialista em Educação
Mestrando em Geografia PPGEO/UFU
professorjakespaulo@gmail.com
Não de hoje, mas
sempre que há pontos que se considera obscuros, ou quando há um movimento de
questionamentos a qualquer norma, a SEE/MG divulga nota técnica a fim de
elucidar pontos na legislação.
Desde que foi
permitido aos professores efetivos atuarem como Apoio à Comunicação, Linguagens
e Tecnologias Assistivas houveram questionamentos sobre essa possibilidade.
Em primeiro
lugar devemos considerar que a forma que a SEE/MG fez essa permissão, a nosso
juízo, era incorreta e continua incorreta com a publicação da NOTA TÉCNICA nº4/SEE/DMTE-CEEI/2019.
Na primeira o professor efetivo deixou o seu cargo de origem e na segunda
despreza a legislação mineira no que se refere a concessão de extensão de
jornada e, erra mais ainda a NOTA nº4/SEE/DMTE-CEEI/2019, quando afirma que
professores regentes de aula são menos preparados que aqueles com formação em
Pedagogia: informação e constatação sem nenhum fundamento técnico ou
estatístico. Para simplificar, a SEE/MG não possui nenhuma pesquisa
quali-quantitativa para fazer tal afirmação.
Vamos por partes.
1.
A nota técnica afirma que o professor efetivo quando
deixa seu cargo para pegar o cargo de ACLTA ou SALA DE RECURSOS está em desvio
de função. (MINAS GERAIS, 2019 p.1)
Nisto existe
concordância, uma vez que o cargo de professor efetivo atuando como ACLTA E/OU
SALA DE RECURSOS não fora designado para cargo em comissão, portanto desvia o
servidor da investidura do seu cargo por meio de concurso público.
2.
A função de ACLTA é uma autorização especial de
atendimento para estudantes com deficiência que tem como objetivo favorecer a
autonomia e independência no processo educacional, por meio de adequação de
material didático-pedagógico, utilização de estratégias e recursos
tecnológicos. (MINAS GERAIS, 2019 p.1)
Neste caso os
professores efetivos possuem graduação e pós graduação em Educação Especial e
são plenamente capacitados para atuarem como ACLTA ou SALA DE RECURSOS.
3.
Nas situações em que o estudante com deficiência
solicitar transferência para outra escola e/ou município o professor efetivo
ficará sem função, devendo assim retornar para a regência da turma,
independentemente do período do ano em que ocorrer a transferência. Tal
situação implicará na dispensa do professor que foi designado para substituição
na regência, causando alterações na metodologia e didática na sala de aula e
gerando grande prejuízo pedagógico a todos os estudantes, devido à rotatividade
de professores. (MINAS GERAIS,
2019 p.1)
Erra
novamente a SEE/MG por desconsiderar o que está previsto na legislação. AO
INVÉS DE CONSERTAR O ERRO, ERRA NOVAMENTE. A legislação mineira, a saber, LEI
15293 DE 05/08/2004 que institui as carreiras dos Profissionais de Educação
Básica do Estado. A Lei trata da possibilidade da extensão de jornada do
professor efetivo, o que nesse caso, não configura desvio de função. A extensão
de jornada existe enquanto houver o cargo em situação de vacância. Assim,
deixando de existir o cargo o professor efetivo perde as aulas ou mesmo por
provimento por causa da movimentação de pessoal ou de provimento por meio de
concurso público.
A lei 15.293/2004 afirma que
Art. 35 – A carga horária semanal de trabalho do
Professor de Educação Básica poderá ser acrescida de até dezesseis horas-aula,
para que seja ministrado, na escola em que o professor esteja em exercício,
conteúdo curricular para o qual seja habilitado.
§ 1º – A
extensão de carga horária, no ano letivo, será:
II –
opcional, quando se tratar de:
a) aulas
destinadas ao atendimento de demanda da escola, em conteúdo diferente da
titulação do cargo do professor; (MINAS GERAIS, 2004)
Reside aqui o erro da SEE/MG uma vez que tanto as aulas
para ACLTA ou SALA DE RECURSOS podem ser ofertadas ao professor efetivo como
extensão opcional. Perceba que, neste caso, o professor efetivo continua com as
suas aulas e com suas turmas e atuará como ACLTA ou SALA DE RECURSOS,
provavelmente no contra turno e que a compatibilidade de horários seja
averiguada pela direção escola e pelo serviço de inspeção escolar, que validam
o QUADRO DE PESSOAL DAS ESCOLAS.
4.
No casos em que o estudante com deficiência se afastar
temporariamente por licença médica, haverá também alterações na regência, uma
vez que o professor efetivo retornará para a regência, gerando a dispensa do
professor designado. Após o retorno do estudante com deficiência para as
atividades escolares o professor efetivo retornará à função de ACLTA e novo
professor será designado para seu lugar. Assim, a turma passaria por, no
mínimo, 3 professores diferentes ao longo do ano, trazendo fortes impactos para
a escolarização. (MINAS GERAIS,
2019 p.1)
Trata de uma
visão mesquinha sobre o processo educativo. O estudante quando em licença para
tratamento de saúde tem direito a continuidade a educação por meio de um regime
especial de educação.
De acordo com
a legislação brasileira, estão previstos alguns casos os quais o aluno pode se
ausentar da sala de aula e mesmo assim continuar a estudar regulamente mesmo
não alcançado o número mínimo de presença.
Para os alunos em condição de aprendizagem, mas que a condição de saúde
impede a frequência do educando à escola, são previstos, em regime de classes
especiais, atividades, cursos, estudos equivalentes ao cursado pelos alunos
regulares. O decreto lei número 1044 de
1969 prevê, no artigo número 1, que são considerados merecedores de tratamento
excepcional os alunos de qualquer nível de ensino, portadores de doenças
congênitas (de nascença) ou adquiridas, infecções, traumatismo ou outras
condições mórbidas, determinando distúrbios agudos ou agudizantes,
caracterizados por:
a)
incapacidade física relativa, incompatível com a frequência aos trabalhos
escolares, desde que se verifique a conservação das condições intelectuais e
emocionais necessárias para o prosseguimento da atividade escolar em novos moldes;
b) ocorrência
isolada ou esporádica;
c) duração
que não ultrapasse o máximo ainda admissível, em cada caso, para a continuidade
do processo pedagógico de aprendizado, atendendo a que tais características se
verificam, entre outros, em casos de síndromes hemorrágicos (tais como a
hemofilia), asma, cartide, pericardites, afecções osteoarticulares submetidas a
correções ortopédicas, nefropatias agudas ou subagudas, afecções reumáticas,
etc.
O artigo
número 2, trata da atribuição de atividades aos estudantes em regime especial,
como compensação a ausência às aulas. Os demais artigos tratam da necessidade
de laudo médico para que o regime excepcional seja autorizado pelo Diretor do
estabelecimento de ensino.
5.
Nas situações em que há desistência do professor efetivo
à função ACLTA no decorrer do ano, este retorna à regência originando dispensa
de professor designado, causando novamente prejuízo pedagógico a todos os
estudantes. (MINAS GERAIS, 2019 p.1)
Respeitando o
direito de todos a uma educação de qualidade, a SEEMG considera que o
atendimento de Apoio à Comunicação, Linguagens e Tecnologias Assistivas deva
ser oportunizado aos estudantes com deficiência, que tiver direito e
necessidade deste suporte, por um professor designado para tal função, pelos motivos
elencados acima.
A Lei 15.293/2004, art 35 ainda afirma que:
§ 7º – A extensão de carga horária será concedida ao
Professor de Educação Básica a cada ano letivo e cessará, a qualquer tempo,
quando ocorrer: (grifo nosso)
I – desistência do servidor, nas hipóteses dos incisos II
e III do § 1º;
II – redução do número de turmas ou de aulas na unidade
em que estiver atuando;
III – retorno do titular, quando a extensão resultar de
substituição;
IV – provimento do cargo, quando a extensão resultar de
aulas oriundas de cargo vago, nas hipóteses dos incisos II e III do § 1º;
V – ocorrência de movimentação do professor;
VI – afastamento do cargo, com ou sem remuneração, por
período superior a sessenta dias no ano;
VII – resultado insatisfatório na avaliação de desempenho
individual, nos termos da legislação específica;
VIII – requisição das aulas por professor efetivo ou
efetivado habilitado no conteúdo específico, quando assumidas por docente não
habilitado. (MINAS GERAIS, 2004)
Ou seja, há
previsão legal para que o servidor efetivo, com a devida habilitação, tenha o direito
a extensão de jornada e há previsão para que ela cesse conforme descrito na
legislação. Ou seja, não há que se falar de desvio de função, no caso da
extensão, uma vez que o servidor efetivo mantém o cargo para qual logrou êxito
na nomeação, posse e exercício por meio de concurso público.
Vou me abster de tecer comentários
sobre o item dois que se refere a Sala de Recursos, pois ornaria repetitivo,
mas frisando: é direito do professor efetivo requerer a extensão de jornada
tanto para ACLTA quanto para a SALA DE RECURSOS.
Sobre a habilitação, a SEE/MG argumenta que
A partir do ano de 2020 a SEE-MG definiu como
primeiro critério para classificação de candidatos para as funções na Educação
Especial – professor de ACLTA, o curso de Pedagogia, por considerar que o
profissional da área da Pedagogia possui em sua formação inicial um conjunto de
disciplinas que versam sobre as metodologias de ensino de diversas disciplinas,
do trabalho metodológico e didático que perpassam por toda a área da educação.
Ao mesmo tempo o conhecimento básico acerca do desenvolvimento humano e as
teorias acerca do currículo colaboram para o melhor desempenho do trabalho do
professor de apoio e de sala de recursos que são voltados, essencialmente, para
o desenvolvimento de estratégias e habilidades que perpassam pelo conhecimento
acerca do desenvolvimento humano e construção de metodologias de ensino
diversificadas que são transversais a todas as disciplinas da educação básica.
(MINAS GERAIS, 2019 p.2)
A SEE/MG
divaga sobre a formação inicial e muito mais, desconsidera que os professores
ACLTA e DAS SALAS DE RECURSOS possuem formação e disciplinas pedagógicas que
versam sobre preparação de materiais. O professor de ACLTA não é o professor do
aluno: ele é como diz o nome, o professor para facilitar a comunicação
alternativa, com viés e caráter tecnológico ou instrumental. Essas técnicas e
saberes são retratadas na elaboração do PDI, PLANO DE DESENVOLVIMENTO
INDIVIDUAL. Assim, o Atendimento Educacional Especializado, na perspectiva da
Educação Inclusiva, assume um caráter exclusivamente de suporte e apoio à
educação regular, por meio do atendimento à escola, ao professor da classe
regular e ao aluno. Tem como objetivo oferecer aos alunos que frequentam a Sala
de Recursos Multifuncional ensino de conteúdos específicos, estratégias e
utilização de recursos pedagógicos e de tecnologia diferenciados, não
existentes na classe regular, que são fundamentais para garantir a sua
aprendizagem e acesso ao currículo comum. Esses saberes o professor efetivo das
disciplinas, e não apenas os com formação inicial em pedagogia também possuem.
É uma segregação sem nenhum cunho científico quali-quantitativo e não se baseia
em pesquisa-ação científica e sim em meras conjecturas de quem elaborou a nota
técnica.
Por fim, ficam esses comentários sabendo que
existem muitos professores aflitos por causa de um emprego via designação e ela
deve acontecer dentro um contexto ancorado na legislação sem mudanças que mudem
governo a governo.
Esses apontamentos, claro, podem ser
refutados, desde que se apresente fundamentação legal pertinente.
Cabe a SEE/MG repensar a NOTA TÉCNICA
nº4/SEE/DMTE-CEEI/2019 e como disse, a meu juízo, repensar tal decisão e
permitir aos professores efetivos que atuem como ACLTA e/ou SALA DE RECURSOS.
Referências
BRASIL.
Decreto-lei nº 1.044 de 21 de outubro
de1969. Dispõe sobre tratamento excepcional para os alunos portadores das
afecções que indica.
MINAS
GERAIS. Lei nº 15.293 de 05 de agosto de
2004. Institui as carreiras dos Profissionais de Educação Básica do Estado.
MINAS
GERAIS. NOTA TÉCNICA nº4/SEE/DMTE-CEEI/2019 de 27 de novembr0 de
2019. Elucidações sobre cargo/função na Educação Especial
POKER,
Rosimar Bortolini et al. Plano de
desenvolvimento individual para o atendimento educacional especializado.
Cultura Acadêmica: Oficina Universitária, Marília/SP 2013
Muito bom! Texto coerente e consistente do ponto de vista legal e pedagógico.
ResponderExcluirExcelente! Parabéns!
ResponderExcluirExcelente artigo. Parabéns!
ResponderExcluirExcelente concordo com você.
ResponderExcluirExcelente . Concordo com você.
ResponderExcluirExcelente! Pautado nas leis que regem a educação.
ResponderExcluirExcelente! Texto com embasamento legal! Parabéns
ResponderExcluirTexto bom de se ler, preocupou em recorrer a legislação muito válido. Enquanto professores precisamos nos apegar a legalidade da questão e não chorumelas de emprego e desemprego. No entanto, os argumentos jurídicos aqui citados caem por terra por uma questão do direito administrativo " cargo e função são conceitos diversos. Vale a leitura da teoria. Resumindo em um trocadilho " Todo cargo tem uma função mas nem toda função tem um cargo". Quando um professor efetivo assume o ACLTA ele está claramente em desvio de função. A função temporária da administração direta está prevista no ART. 37 da CF que deve ser provida por contratação.
ResponderExcluirExcelente texto para reflexão!! 👏👏
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirExcelente texto para reflexão!!👏👏
ResponderExcluirGostei do texto também, mais os professores efetivos não vão pegar como extensão. Querem como único cargo.
ResponderExcluirMuito obrigada pela sua contribuição.
ResponderExcluirObrigada por acrescentar, texto muito bem exposto!
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